quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Espelho Rápido

É só uma pequenina questão de desagrado aos olhos, não de cultura da arte, propor "uma ação entre os amigos de Porto Alegre para despachar obras de arte doadas por artistas para outro lugar",de acordo com texto publicado e mural de opinião proposto esses dias aos leitores do jornal de maior circulação do estado.


No final, o problema é com a arte chamada especialmente de contemporânea, e com a Bienal do Mercosul. Ela  já  começou.


Morar numa cidade em que há obra concebida especificamente para um de  seus espaços  públicos, como a do artista Waltercio Caldas http://www.walterciocaldas.com.br  é  um privilégio. Doada em 2005 ao município pela Fundação Bienal do Mercosul (outro privilégio) para ser incorporada ao acervo permanente da cidade, Espelho Rápido foi patrocinada pelo Grupo Gerdau.










Assim como os outros artistas convidados para realizar as obras permanentes naquela edição da Bienal do Mercosul, Waltercio Caldas frequentou o espaço em que projetou  sua  obra, 
à  beira do Guaíba, com antecedência de mais de um ano.





Infelizmente, em dois anos, Espelho Rápido foi quase arruinada por furtos e vandalismo. "Skatistas arrancaram parte das hastes em aço inoxidável para incrementar suas manobras sobre o piso de granito, ladrões serraram e carregaram outro tanto de aço, pichadores se lançaram sobre os grandes blocos de basalto", diz o mesmo jornal que jogou no ar a rejeição de articulista a essa obra entre outras.
Segundo a Associação Brasileira do Ministério Público do Meio Ambiente, o que houve com essa obra é apenas uma mostra do que vem acontecendo com todo o patrimônio público cultural de Porto Alegre. Das cerca de 340 esculturas da cidade, 90% já foram alvo de algum tipo de vandalismo. 






terça-feira, 27 de outubro de 2009

Esmeralda

 Houve um debate inter-estadual  hoje na  tv  sobre o atual problema  do crack. A tragédia do rapaz de classe média  que matou a amiga no Rio de Janeiro,  sob efeito da droga, acionou o destaque à questão. Especialistas de diversas áreas, de mais de um estado do país,  conversaram com jornalistas sobre ações para a cura do vício, repressão aos traficantes, combate ao tráfico de armas. Falou-se também sobre internação para tratamento, público e particular.Sobre clínicas clandestinas particulares onde há tortura por meio de remédios e agressões físicas.


Da cidade de São Paulo, uma moça, a  Esmeralda, foi convidada para dar seu testemunho como ex-viciada. Há  12 anos,  ela se afastou dos roubos, do morar  na rua, do crack. Teve um filho, fez  faculdade, escreveu livro e está envolvida com música. Suas intervenções foram as mais importantes do debate. Questionou o momento tardio em que o assunto surge na mídia, já que há mais de 20 anos existe o crack nas ruas, mas é que agora tornou-se problema também de ricos, reclamou. Chamou a atenção a  respeito do modo como o assunto é abordado, com os termos pouco claros dos especialistas. E  disse o mais  importante:


-vocês só falam na repressão, punição, mas não estão ajudando a quem vive o problema como drogadito. Não adianta dizer: "não use crack", " crack mata". Digam o que fazer para preencher o vazio por não ter tido e não ter amor, nem ser aceito. Dentro e fora da família. A publicidade diz coisas o tempo todo e vocês  não dizem.


Esmeralda foi mais longe, falou que não vê muita diferença entre ricos e pobres, em relação ao querer ser amado e  aceito. E, para ela, a prevenção tem que caminhar por aí. Ela tem muita razão.



sábado, 24 de outubro de 2009

imagem e contexto






foto Jean Pimentel ( jornal Zero Hora )




Se essa imagem não tivesse sido publicada junto a matéria de jornal, poderia ser uma outra coisa. Mas é  a  imagem  do cotidiano de  16  estudantes de 8ª série que, há 4 anos, tem aula na capela Nossa Senhora Aparecida (santa padroeira do Brasil), onde são realizados  velórios. Não há verba no município para reformar o local da escola destinado às aulas. E a capela para velórios fica em frente, muito próxima.


Quando há velório, ou os alunos são transferidos para  a sala dos professores (da escola), ou ficam sem aulas, dizem seus  pais.


O presidente da Associação de moradores, que preside também a própria capela, diz que a comunidade católica não vai mais ceder o espaço da capela. "Na idade deles, adolescentes, não podem ter aula aqui. Já aconteceu até de comerem hóstia – reclama o presidente da Associação". 

Ele se preocupa também com o fato de os adolescentes ficarem impressionados a cada velório.



A direção da escola afirma que os velórios são raros no bairro Maggi de Cesaro


Local: Passo Fundo, RS,Brasil


Uma enorme violência contra a vida,e o futuro.






sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Jorge Macchi

http://pphp.uol.com.br/tropico/html/textos/2487,1.shl
Vidas paralelas, 2005
réguas de madeira de 50 cm, linha de costura
50 x 120 cm












quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Richard Rorty

Está  sendo  lançado  nesses  dias, no  Rio de Janeiro, o  livro Filosofia como Política Cultural, pela editora Martins Fontes, com ensaios escritos  entre 1997 e 2005 pelo  filósofo norte-americano Richard Rorty www.richardrorty.com.br/index.htm


Para Rorty, o impulso que nos leva  a  pensar, a investigar, a  tecermo-nos de maneira cada vez mais complexa, não é o espanto diante do mundo, que Aristóteles atribuía como a causa do início da Filosofia, mas o horror de descobrirmo-nos como uma réplica, uma cópia. E acabar os nossos dias  num mundo que nunca fizemos, que foi herdado. Espera-se inventar  novas formas de sermos humanos e  não  confirmar  a  estabilidade e a ordem. 
O apreço pela contingência caminha em sentido diverso da busca de um sentido universal para a existência humana, este marcado pelas grandes continuidades, pela permanência e pelo caráter a-histórico da vida humana. Deste modo, um selo viria impresso em nós, como uma marca essencial e necessária.


E não há como fundir espaço privado e público, lembra Rorty. Não encontramos uma perspectiva única que possa abarcar justiça, solidariedade humana e perfeição privada. A autocriação e a justiça social não tem como ser colocadas juntas ao nível da teoria.  Providências sociais e políticas não podem ser tratadas com as mesmas ferramentas que a busca de realização pessoal, auto-criação e auto-desenvolvimento.


Indo ainda mais longe, Rorty  fala de uma utopia ( compreendida como algo não estático), em que não há obrigatoriamente, entre os intelectuais, uma identidade em relação ao que buscam como pessoas, individualmente, nem eles seriam os detentores do debate e das decisões acerca do objetivo da sociedade como um todo, nem haveria interesse social em saber que intelectual estaria "controlando tudo".





perigo, arte


  "a arte didática resulta da necessidade. Leva para o foco, faz convergir. As obras mais inexplicáveis seduzem – quer dizer, etimologicamente, levam para o lado. Afastam da linha. Tiram de foco. Tiram do sério, como se diz. (Como o desejo)."






http://www.youtube.com/watch?v=fZYFgVLZjDc

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Politização na arte

Ainda com Ronaldo Brito, pensando a arte :


 Diferentemente da  arte partidária, valorizada num passado nem tão distante, é  melhor falarmos hoje que a politização na arte  está mais próxima de uma " tomada de consciência por parte do artista do modo como o produto artístico é consumido em nossa sociedade, bem como a tomada de consciência de seu papel de agente cultural nessa mesma sociedade". E ainda: " a crescente politização dos artistas ocidentais se manifesta sobretudo como a recusa das margens tradicionalmente reservadas à arte - para que não atingisse, perigosamente, a vida prática das pessoas. Como um esforço de conhecer as possibilidades da arte de servir como um modo de  transformar as relações das pessoas consigo mesmas e com a sociedade. A politização dos novos artistas talvez seja o reconhecimento de que o mito do artista como alguém que vivia nas nuvens caiu irremediavelmente por terra, e é hora de saber qual o seu lugar no mundo dos vivos".
Ronaldo Brito publicou essas idéias em 1974, no texto O acontecimento artístico, um dos mais censurados entre seus textos da seção cultural do jornal Opinião que acabou em 1977. 









  Quando se diz hoje que a arte não serve para nada, é para enfatizar a desvalorização de seu comprometimento com, ou de seu estar a  serviço de determinados movimentos, como os de "poder político", que pretenderam aniquilar a pluralidade humana, como ocorreu  com o realismo socialista. Também a arte não tem como função decorar e embelezar ambientes.



segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Demiurgo

              poema de Ronaldo Brito em  Quarta do Singular (1989)


Arte está em apagar
uma a uma as palavras
multiplicar assim
o aspecto geral do nada
tumultuosos crípticos
fabulosos nadas
matéria da vida exata
textualmente volátil










domingo, 18 de outubro de 2009

Reflexão na visão de imagens

  trabalho em gravura de Regina Silveira  http://reginasilveira.uol.com.br  na exposição Dentro do traço, mesmo.






Regina Silveira,2006
água, tinta e processo serigráfico
69 x 49,3 cm

Mostra de parte do acervo de arte contemporânea em gravura da Fundação Iberê Camargo,em Porto Alegre,com curadoria de Teixeira Coelho que concebeu para esse evento uma imprevisível  disposição física para as obras. Livres de molduras, fixadas com pregos em painéis, paredes de madeira simples e crua, ou em cima de  mesas de  mesmo aspecto,as gravuras ficaram mais visíveis em si mesmas e, ao mesmo tempo, mais próximas da visão e do corpo do espectador. Diz o curador que sua intenção maior - como resposta  à idéia do Programa do Ateliê de Gravura da Fundação Iberê Camargo - foi   “ser fiel, como possível, à tendência de Iberê de ‘não emitir conceitos, não propor definições’. Ver a gravura como um modo de pensar e sugerir uma dança livre a seu redor." 
Além dessa obra de Regina Silveira,estão na exposição, entre outras, gravuras de 
Amílcar de Castro, Daniel Senise, José Rezende, León Ferrari, Nelson Leirner, Jorge Macchi,  Álvaro Siza – o arquiteto responsável pelo projeto da sede da instituição.
Dentro do traço, mesmo.  fica  no Iberê até 19/11/2009




    Lago Guaíba visto do Museu Iberê Camargo, foto de Vicente Frei...






   
 Museu Iberê Camargo, foto  de Vicente Frei...










Mixidez

É  uma tradução possível  para a palavra  mixité , em francês - aquilo que é misto, que tem os  componentes  feminino e  masculino. Está relacionada à idéia de escola  mista ( para ambos os sexos). Algo incomum ainda no início da segunda metade do século 20. 


A  filósofa francesa contemporânea, Sylviane Agacinski (que não está tratando de sexualidade) utiliza a idéia de misto para valorizar a diferença (o contrário de  identidade) estão que estão numa origem que não é simples, nem única, por ser  feminina e masculina, ponto de partida da diversidade humana que se faz visível em cada pessoa. Cada homem e/ou cada mulher é também um tanto misto e múltiplo. 
É pensando na humanidade a partir desse duplo começo que a filósofa pergunta: " Não é o outro sexo, para nós, a fisionomia mais próxima do estrangeiro? Pois é da forma que pensamos o outro sexo que depende o modo de pensarmos o outro, em geral". E há um esforço interminável da humanidade,que prima pela plasticidade, para interpretar, cultivar, dar sentido à diferença dos sexos.


 Da reflexão em torno da mixidez  fica a  distância entre os sentidos que se pode dar às palavras desigualdade e diferença, bem como de suas consequências  O primeiro, a ser combatido em sua prática, na vida pessoal, social,o segundo, a  exigir maior atenção por ser determinante, também pessoal e socialmente.Outra coisa que fica em evidência  é que, por mais que se tente, o mundo, os feitos, as pessoas, jamais serão compreendidos  com simplificações e por conveniências. Parece óbvio, mas na prática é o que mais se faz.